A Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) vem por meio desta nota pública expressar sua preocupação frente às recorrentes entradas e instalações da Polícia Militar de Santa Catarina (PMSC) na Terra Indígena (TI) Morro dos Cavalos, município de Palhoça (SC).
Na noite de 30 de agosto de 2022, a comunidade guarani em Morro dos Cavalos presenciou a entrada de dezenas de policiais e viaturas em seu território e já são diversas as noites em que os moradores foram acordados pelo que parece ser uma operação de treinamento noturno. A comunidade relata que ouviu por diversas noites o barulho de sirenes, gritos e sequências de disparos de armas de fogo, que vêm assustando as famílias, sobretudo as kyringue (crianças) e os mais velhos.
Essa é a segunda vez que um episódio deste tipo ocorre em menos de um mês, como mostram as imagens do início de agosto que compartilhamos nesta nota. Até o momento, a Polícia Militar continua a circular pelo interior da Terra Indígena por razões desconhecidas pela comunidade. Destacamos a gravidade dos fatos: em uma das noites (3/8), um indígena chegou a ser abordado por policiais militares enquanto transitava de uma aldeia a outra e sofreu intimidações ao mencionar que residia na aldeia.
Por conta dessas atividades ostensivas e intimidatórias de forças policiais na TI Morro dos Cavalos, a comunidade procurou os órgãos competentes e a própria Polícia Militar, que por sua vez nos afirmou desconhecer de que aquele território é uma Terra Indígena, com moradores do povo Guarani. Ao mesmo tempo, esse episódio evidencia lacunas no trabalho de proteção territorial que é de atribuição da Funai. Continuando sua luta também no âmbito judicial, a Comunidade da Terra Indígena Morro dos Cavalos, através da CGY, tem atuado na ação civil pública movida pelo MPF em 2017, na qual há decisão liminar obrigando Funai e União a adotarem todas as providências necessárias para garantir a proteção e a fiscalização da TI. No entanto, o poder público tem se mostrado disposto a continuar omisso ainda que isso implique o descumprimento de ordens judiciais. Por esse motivo, a Comunidade da Terra Indígena Morro dos Cavalos e o MPF já informaram a Justiça Federal sobre os novos ocorridos na TI e reiteraram o pedido de que órgão indigenista tome todas as providências cabíveis para coibir a repetição de situações como esta, de afronta aos direitos constitucionais indígenas.
Nesse sentido, informamos também que esse ingresso tem se dado sem qualquer consulta prévia, livre e informada ou qualquer outra forma de comunicação às lideranças e comunidade da TI Morro dos Cavalos, o que para nós, é um uma grave violação de nosso direito territorial e de modo de vida.
Esta nota não é um pedido para que a Polícia Militar deixe de cumprir seu papel quando acionada pela comunidade guarani da TI Morro dos Cavalos ou pela Funai, mas um pedido de respeito para com nosso povo e nosso território.
Nosso território há tempos é preservado e produzido por nós, povo Guarani, para garantir um ambiente seguro e tranquilo para o crescimento de nossas crianças e o devido descanso dos mais velhos. Esse tipo de ação ameaça nossa autonomia e aquilo que desejamos fazer em nossas tekoa, ainda mais quando realizados sem qualquer forma de comunicação.
Pedimos, portanto, a atuação dos órgãos públicos, como Funai e MPF, para que apurem esses fatos e que sejam suspensas de imediato quaisquer atividades de treinamento policial previstas ou em curso nas aldeias em questão. Ao mesmo tempo, a CGY seguirá cobrando, inclusive judicialmente, a responsabilização de particulares não indígenas que cedem as áreas por eles ocupadas no interior de da TI Morro dos Cavalos para atividades incompatíveis com os modos guarani de habitar e proteger esse território.