Em decisão unânime, Supremo aponta inconstitucionalidade em norma do estado de SP e impede exploração comercial nessas áreas, com fundamento na Constituição e em subsídios apresentados por organizações representativas
Por Assessoria Jurídica da CGY
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu impedir que áreas de Terras Indígenas, territórios quilombolas e de outras comunidades tradicionais sejam concedidas à iniciativa privada. A decisão foi tomada de forma unânime em julgamento virtual, encerrado no dia 19/5, no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7008, ação em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) questiona a Lei estadual n° 16.260/2016 de São Paulo que autoriza a Fazenda Pública a conceder à iniciativa privada áreas inseridas em unidades de conservação ambiental estaduais para a exploração de serviços ou do uso inerentes ao ecoturismo e à exploração comercial de madeira ou de subprodutos florestais.
Embora o estado de São Paulo tenha competência legislativa sobre as unidades de conservação ambiental estaduais, no entendimento da PGR, a autorização para concessão à iniciativa privada de áreas de parques incidentes em Terras Indígenas (TI) violaria a competência da União para legislar sobre o tema, além de violações relacionadas às garantias constitucionais do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, CF/88) e o regime de proteção das populações indígenas (art. 231 e 232 CF/88).
A Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) em conjunto com outras organizações representativas de povos e comunidades tradicionais, associações quilombolas e organizações de defesa de direitos socioambientais, atuou na ação enquanto amicus curiae (“amigo da Corte”) – pessoa ou instituição que participa de um julgamento levando subsídios ao tribunal para fundamentar um argumento e auxiliar a decisão.. As organizações defendem os interesses e direitos dos povos e comunidades tradicionais de São Paulo que estavam em iminência de serem afetadas.
De acordo com levantamento feito pelas organizações e apresentado ao STF, das 25 unidades de conservação (UC) compreendidas na lei estadual, ao menos 18 têm sobreposição total ou parcial com Terras Indígenas, territórios quilombolas e de comunidades tradicionais, caboclas e caiçaras.
Pelo entendimento do relator do caso no Supremo, o ministro Luís Roberto Barroso, é inconstitucional a norma estadual que concede à iniciativa privada a possibilidade de exploração florestal e turismo em Terras Indígenas, por serem terras públicas de domínio da União e de usufruto exclusivo dos povos tradicionais.
Com a decisão, a Suprema Corte assegura os direitos do povo Guarani de ao menos seis (6) TIs, que tiveram seus territórios excluídos da possibilidade de concessão à exploração pela iniciativa privada: TI Tenonde Porã e TI Jaraguá, ambas na capital paulista, TI Peguaoty e TI Pakurity, no Vale do Ribeira, TI Rio Branco, em Itanhaém, e TI Aguapeú, na região litorânea, todas sobrepostas a unidades de conservação estaduais.
Ao julgar, o STF determinou que “concessão pelo Estado não pode incidir sobre áreas tradicionalmente ocupadas por povos indígenas, remanescentes quilombolas e demais comunidades tradicionais”, fundamentado nos mapas e documentação oferecidos pela CGY e demais amici comprovando a sobreposição dessas áreas com as unidades de conservação atingidas pela lei que permitiria a concessão. Além disso, determinou a obrigatoriedade da consulta prévia, livre e informada a povos e comunidades atingidos e em áreas próximas às UCs a serem concedidas.