8 de nov de 2024 | 17:11
Após pressão, DPU retoma nomeação em defensorias de direitos humanos

Coletivo de organizações e movimentos sociais, dentre eles Apib e CGY, cobraram solução urgente do órgão para vacância de cargo em diversas regiões do país, em nota pública – Leia o documento

Por Assessoria Jurídica da CGY


Após a sociedade civil publicizar a situação de ausência de defensores públicos regionais de direitos humanos, a DPU (Defensoria Pública da União) fez as primeiras nomeações de defensorias em locais em que este cargo estava vago.

Em um primeiro gesto após a manifestação, a DPU nomeou o defensor público Nuno Castilho Coimbra da Costa para o estado do Paraná, marcando o restabelecimento da proteção dos direitos humanos pelo órgão, em um contexto de conflito fundiário violento e crise humanitária.

A grave situação de vacância no cargo de defensoras e defensores regionais de direitos humanos (DRDH) em todas as regiões do país motivou uma mobilização de entidades e instituições pela garantia de direitos de populações e grupos vulneráveis e que estão em situações de conflito e exposição à violência. O grupo reivindica que a DPU trate a questão de maneira adequada e urgente.

Na última sexta-feira (11), em nota pública, o coletivo de quase 40 organizações sociais e movimentos populares, dentre eles Apib e CGY, manifestou preocupação com a ausência de DRDH em todo o Brasil resultante da falta de nomeação pela DPU (leia abaixo). As entidades assinalaram as dificuldades no cenário interno da instituição para o adequado preenchimento da vaga e a devida nomeação, e enfatizaram que a falta de nomeação prejudica justamente comunidades que eram ou poderiam ser atendidas pela DPU.

Leia a NOTA PÚBLICA SOBRE A VACÂNCIA DOS CARGOS DE DEFENSORES E DEFENSORAS REGIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ÂMBITO DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO (Abaixo)

Desde o início do ano, diversos ofícios haviam sido enviados à DPU por mais de 20 entidades, sem obter resposta da instituição, e a despeito dos esforços da própria Defensoria Nacional de Direitos Humanos (DNDH) do órgão.

O cargo de DRDH tem abrangência estadual e é exercido no âmbito da DPU, que faz a nomeação dos titulares, e estava vago em pelo menos 15 estados brasileiros – Paraná, Maranhão, Espírito Santo, Acre, Rio Grande do Norte, Sergipe, Tocantins, Bahia, Pernambuco, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Amapá, São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso. Outros 7 estados têm apenas defensores titulares, sem defensores substitutos nomeados.

Cinco dos estados sem o ofício compreendem o território tradicional do povo Guarani, yvyrupa (PR, SP, RJ, ES e MS), onde há presença de comunidades mbya, nhandeva, e kaiowa e guarani, em Terras Indígenas regularizadas ou em diversas etapas do processo demarcatório, em regiões marcadas pela violência.

Na portaria que nomeou o titular do Paraná, divulgada nesta quarta-feira (6), as palavras do Defensor Público-Geral Federal pontuam o agravamento de conflitos envolvendo a demarcação de terras indígenas na região oeste do estado. Assim, a DPU sinaliza diretamente à escalada de violência contra o povo Ava-Guarani, sobretudo na Terra Indígena Tekoha Guasu Guavira, onde atualmente as comunidades indígenas estão sob ataques sistemáticos organizados por produtores rurais, nos municípios de Guaíra e Terra Roxa.

Na nota, as entidades afirmam que a ausência de defensores em pastas especializadas em defesa de direitos humanos na DPU aumenta a vulnerabilidade de comunidades em situação de conflito e/ou ameaçadas, bem como aquelas que sofrem com uma ampla gama de negação de acesso a direitos.

O documento afirma que o Brasil é um dos países que mais vitima pessoas que defendem direitos humanos, registrando ao menos 3,4 milhões possíveis violações de direitos humanos, em 2023, apontados em dados da Anistia Internacional. Outro dado é da Pesquisa Nacional da Defensoria Pública de 2021, que registrou a falta de cobertura territorial da DPU em 71% das comarcas, o que ressalta a atuação das DRDH “ainda mais necessária e urgente”.

Confira a íntegra da Nota Pública sobre a vacância dos cargos de defensores e defensoras regionais de direitos humanos no âmbito da Defensoria Pública da União:

A Defensoria Pública da União (DPU) cumpre um papel institucional fundamental de promoção e defesa de direitos humanos. Para fortalecer tal função, a instituição do Sistema de Defensoras e Defensores Nacional e Regional de Direitos Humanos da DPU foi criado em 2016, com objetivo de estruturar a atuação da instituição em demandas coletivas visando promover a proteção de direitos humanos de grupos vulneráveis e em situação de conflito.

Isso porque, a partir da lei complementar nº 132/2009, foram incorporadas funções institucionais à DPU que lhe permitiram uma atuação mais abrangente e democrática, visando a proteção de direitos humanos, conforme o disposto nos incisos I e III do art. 4º:

I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus; (…)

III – promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico;

Nesse sentido, este Sistema possui ampla articulação com a sociedade civil, tendo esta, inclusive, voz ativa na eleição do (a) Defensor (a) que irá exercer o mandato de DNDH. Nos estados, os Defensores e Defensoras Regionais de Direitos Humanos (DRDHs) são os responsáveis pelo acompanhamento de demandas coletivas de direitos humanos. Atualmente, o ocupante do cargo de Defensor Público Geral (DPG) é responsável direto pela publicação de editais de seleção e nomeação das pessoas que irão exercer a função de DRDH. Entretanto, neste último ano, cargos de DRDH estão vagos em inúmeros estados, em razão da resistência da própria instituição em proceder com o adequado preenchimento da vaga e a devida nomeação.

Diversos ofícios foram enviados por mais de 20 entidades à DPU desde o início do ano, sem que o problema tenha sido resolvido pela instituição, apesar dos diversos esforços da atual Defensora Nacional de Direitos Humanos (DNDH), e a despeito dos graves impactos que a ausência de Defensorias Regionais de Direitos Humanos gera para as populações que eram ou poderiam ser atendidas pela Defensoria Pública da União.

Foi verificado junto à instituição que ao menos 15 estados não possuem DRDH nomeados (as)1, quais sejam: Paraná, Maranhão, Espírito Santo, Acre, Rio Grande do Norte, Sergipe, Tocantins, Bahia, Pernambuco, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Amapá, São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso. Há também os casos em que os estados possuem DRDHs titulares nomeados (as), mas não possuem sequer defensores (as) substitutos (as) nomeados (as), quais sejam: Roraima, Rondônia, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Alagoas, Pará, Paraíba e Goiás.

As Defensorias Regionais de Direitos Humanos são importantes órgãos de apoio locais para promover o acesso à justiça e a efetivação de direitos dos grupos vulnerabilizados. Principalmente porque são estes (as) defensores (as) que estão próximos (as) aos territórios em conflito, nos quais ocorrem graves violações de direitos humanos. Dada a extensão territorial, diversidade cultural e complexidade dos conflitos no Brasil, a existência de defensores e defensoras locais destacados (as) para a atuação em tutela coletiva de direitos humanos é de extrema importância para a garantia de direitos de comunidades vulneráveis.

A ausência de defensores (as) em pastas especializadas em defesa de direitos humanos no âmbito da DPU aumenta a vulnerabilidade de comunidades em situação de conflito e/ou ameaçadas, bem como aquelas que sofrem com uma ampla gama de negação de acesso a direitos. O Brasil é um dos países que mais vitima pessoas que defendem direitos humanos e registrou, em 2023, ao menos, 3,4 milhões possíveis violações de direitos humanos, segundo dados da Anistia Internacional. Além disso, segundo dados da Pesquisa Nacional da Defensoria Pública de 2021, a falta de cobertura territorial da Defensoria Pública da União atinge 71% das comarcas, portanto a atuação das DRDH é ainda mais necessária e urgente. Diversas normas nacionais e internacionais reforçam o direito das populações de terem a melhor estrutura possível para acesso a direitos, sem retrocessos e, ao contrário, com sua melhoria contínua, sempre no máximo possível da estrutura disponível – como a Constituição Federal, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. A própria Corte Interamericana já se posicionou que é dever dos Estados partes organizar sua estrutura de modo a viabilizar efetivamente o livre e pleno exercício dos direitos humanos.

A omissão na nomeação do(a) defensor(a) tem implicações graves, resultando muitas vezes na escalada de violações de direitos humanos contra grupos que já sofrem com omissões do Estado brasileiro e negativas de direitos fundamentais.

Assim, os movimentos sociais e entidades que subscrevem essa nota reforçam a necessidade de autonomia funcional da DNDH, e demandam que a nomeação dos Defensores e Defensoras Regionais de Direitos Humanos nos estados seja tratada de maneira adequada e urgente pela Defensoria Pública Geral da União.

Assinam:

1. Comissão Pastoral da Terra – CPT
2. Terra de Direitos 
3. Conselho Indigenista Missionário – Cimi Regional Sul
4. Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
5. Comissão Guarani Yvyrupa – CGY
6. Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas – Obind/UnB
7. Observatório da Temática Indígena na América Latina – OBIAL-Unila
8. Federação das Comunidades Quilombolas do Paraná – FECOQUI/PR
9. Associação Quilombola e Afrodescendente da Restinga
10. Instituto Democracia Popular
11. Rede de Apoio e Incentivo Socioambiental (RAIS)
12. Guilherme Assis de Almeida, ex-presidente da Andhep (Associação Nacional de Direitos Humanos – Pesquisa e Pós-graduação)
13. Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
14. Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
15. Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM
16. Campanha Nacional Contra a Violência no Campo
17. Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ
18. Rede Nacional de Advogadas e Advogados Quilombolas – RENAAQ
19. Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAP
20. Centro Popular de Direitos Humanos – CPDH
21. Movimento dos Trabalhadores Sem Teto do Rio Grande do Sul – MTST RS
22. Central de Movimentos Populares – CMP
23. União Nacional por Moradia Popular – UNMP
24. Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES
25. Grupo GUARÁ
26. Movimento Nacional de Luta por Moradia de Sergipe – MNLM SE
27. Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
28. Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico – IBDU
29. Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos Goiás – MTD GO
30. Habitat para a Humanidade – Brasil
31. Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais
32. Movimentos de Trabalhadoras e Trabalhadores Sem Teto – MTST
33. Associação dos Geógrafos Brasileiro, seção local de Marechal Cândido Rondon (AGB/SLMCR)
34. Geolutas – Laboratório e Grupo de Pesquisa de Geografia das Lutas no Campo e na Cidade
35. Jubileu Sul Brasil
36. Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura – CONTAG
37. Pastoral Operária do Espírito Santo
38. Articulação Nacional de Agroecologia – ANA
39. Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM – Brasil)

01 de novembro de 2024

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